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O pirata do pincel negro (de nanquim)

Por  Hélio Brandão

 

Bruno de Morais singra a cidade em busca de tesouros. Em meio à esterilidade do asfalto e do concreto, ele saqueia histórias aqui e ali para mostrar que muita coisa pulsa para além dos fluxos controlados de faixas de trânsito, filas de banco e elevadores lotados de silêncio constrangido. Bruno é o Pirata da Cidade Terra.


O jovem quadrinista nasceu em 1991 e já pequeno descobriu sua afinidade com a ilustração. Conta ele que, aos três anos de idade, desenhou uma vaca, mascote de uma marca de laticínios, e ali ele começou a perceber que gostava mesmo dessa coisa de desenhar. Pirata pode dizer, com orgulho, que já sabia o que queria da vida antes mesmo de perder o medo de mosquitos, feito alcançado apenas anos depois.

Entre aquela vaquinha e a vindoura HQ a ser lançada na próxima edição do Festival Internacional de Quadrinhos (FIQ), em Belo Horizonte, a jornada foi longa. Como todo bom pirata, Bruno se aventurou em diversas frentes, sempre se aprimorando, e esta ainda é uma de suas maiores preocupações. Quando precisou desbravar uma floresta, surpreendeu-se: sabia fazê-lo. Desenhar crianças ou personagens orientais? O pincel (mais rápido do que a espada, dado que é parente da caneta) deu a resposta antes da pergunta ser formulada: “Eu sei fazer isso”?

Esse senso de desbravamento da própria capacidade levou Pirata dos lagos da ilustração para a torrente da arte sequencial. Quando ele viu um amigo de infância esboçando sua primeira história em quadrinhos, quis saber se conseguiria fazer uma também. Obviamente, não a concluiu. Marujos de primeira viagem podem sentir algum enjoo, mas Bruno não desistiu e prosseguiu produzindo tantos desenhos, rascunhos e ideias que encheu seu quarto de tesouros e traças. É complicado ser pirata.

Curiosamente, as histórias em quadrinhos não eram a principal influência de Bruno nesta época. Ao entrar na adolescência, o gosto por animações (principalmente japonesas) será decisivo para continuar empurrando-o em direção a novos desbravamentos. 

Decidiu obter um aprendizado formal, ingressando em uma escola onde aprendeu técnicas de quadrinhos e um punhado de vícios que ele já fez questão de superar. Bruno navega sob a própria bandeira, afinal, e não tem medo de dizê-lo. Içou a bandeira preta em pleno curso na Escola de Belas Artes da UFMG e bradou: “sou um quadrinista”! Alguns olhares de susto e tiros de aviso foram disparados, mas no fim o Pirata concluiu o curso com duas tirinhas-pôster, onde explorou as onomatopeias.

Mas artista independente leva no peito a responsa, tiozão, e não vem dizer que não. Mares bravios levaram ao encontro com Jão e, projetos vão e projetos vêm, ambos estão preparando o lançamento do selo Passaporte, com a proposta de fazer um quadrinho brasileiro autoral e artesanal; a iniciativa conta até mesmo com um projeto de crowfunding no Catarse, com o objetivo de coletar sete mil reais em contribuições para a impressão dos primeiros títulos do selo e lançamento no Festival Internacional de Quadrinhos (FIQ).

Mas como é essa ideia de quadrinho artesanal? Pirata explica que a capa de Cidade Terra, por exemplo, será feita por meio de serigrafia. A ideia é concentrar todo o processo de produção nas mãos dos autores, do desenho à impressão. A liberdade do quadrinista é o norte da bússola criativa da dupla.

Para concretizar suas ideias, Pirata esboça a história e a modifica diversas vezes. Às vezes, concebe um personagem ou algum elemento específico sem saber como articular uma história no entorno, mas ele sempre encontra um caminho. Audacioso, ele se propõe desenhar aquilo que ele não sabe se é capaz, mas admite que a internet facilitou seu trabalho de pesquisa a ponto dele não olhar pela janela para encontrar aquele objeto que estava procurando o dia inteiro – quase um tapa-olho do pirata contemporâneo.

O traço do Pirata é decidido, certeiro, tranquilo. Percorrendo o papel com fluidez, ele consegue criar impressões de movimento no voo de pássaros (como na história “Tombo”, realizada durante sua graduação) e até dar leveza à rigidez dos prédios na cidade (a exemplo da história “Caixa de Sapatos”, também realizada em sua graduação). Em alguns momentos ele explora a variação de cores, mas admite que não é sua levada. O Pirata singra sob uma bandeira em preto-e-branco, afinal.

Antes de deixarmos o quadrinista seguir seu caminho, acabamos passando pela pergunta fatídica de todo quadrinista (e artistas em geral): como viver disso? A empreitada do selo Passaporte, embora iniciada por financiamento coletivo, promete velejar com a força dos ventos, por si própria. E é com a certeza de que vai encontrar seu baú de tesouros (livre de traças, esperamos), que Bruno Pirata nos conta de seus projetos futuros. Só podemos erguer nossos copos de rum e desejar boa sorte a ele, enquanto observamos seu navio procurar destinos cada vez mais ousados.
 
Este relato foi encontrado pelos valentes exploradores Hélio Brandão e Elisa Carvalho.

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Facebook selo Passaporte: https://www.facebook.com/PassaporteEditorial


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O HERÓI DO GIBI

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